terça-feira, 10 de julho de 2012

Zé Caveira



JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade

6 comentários:

  1. Gosto desta música.
    Aqui quando um grupo se junta para tomar uma, tocar e cantar, esta música sempre no repertório.
    Beijos!!

    ResponderExcluir
  2. Olha para vc ver como são as coisas, eu estava procurando outra coisa e acabei, por acaso, achando este texto. E fiquei surpreso, pois desconhecia que era de autoria de Carlos Drummond de Andrade. A música é muito famosa. Não sou fã dela, mas sempre me identifiquei com a letra, mais ainda nestes últimos tempos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Eu vi um documentário sobre a vida dele e mostrou exatamente esta música.Também fiquei surpresa.
      Beijos!

      Excluir

Todos os comentários serão respondidos.

Marcadores